quinta-feira, 29 de abril de 2010

Curiosidade Mórbida

Procurando espaço para respirar entre as paredes cheias de musgo, tento encontrar o fim deste corredor. Por pura curiosidade suicida entrei na fresta que se escondia atrás de arbustos no meio da floresta. Uma placa dizia, Antes de entrar, deixe aqui sua sombra. E assim o fiz sem saber muito quanto vale uma sombra.

Começo a caminhada, a aventura se faz a melhor do mundo. Meu cérebro não funciona e a adrenalina comanda meu corpo. Alguns metros adiante, percebo que sangue escorre da minha cabeça, mas não sinto nenhuma dor ou incômodo. Me mordo, me aperto e, enfim, descubro para que servem as sombras.

Quando meu relógio, que nunca uso, bate 12h, descubro que há vinte minutos me enfiei neste buraco. Ao perceber as horas, vejo também que meus braços estão cobertos de insetos, que minha cara é lama pura e imagino que não me reconheceria no espelho com os tantos cortes sentidos na pele.

O nervosismo substitui a adrenalina com a velocidade da luz. Os insetos que antes não via, agora sinto. Se movendo em todas as direções num baile de antenas. A lama que não existia chega aos meus joelhos e cobre minhas mãos. Os cortes ardem e eu percebo que há luz no fim o túnel.

A luz é tênue, mas consegue iluminar o caminho. Na verdade sinto a luz, mas não posso identificar de onde vem. Meus olhos lacrimejam sem parar e a visão está completamente embaçada. Sinto minha garganta, seca. Minha boca cheia de terra e larvas. Meu nariz que não cheira mais nada.

Teias de aranha me aquecem quando não há frio ou calor. Só há anestesia. Ratos se aninham em minhas pernas, como gatos dizendo bom dia. Insetos fazem o que se espera deles, mordem. Mordem muito. Aranhas brincam com meus lábios e eu não sinto, simplesmente. A luz desaparece.

Por duas vezes tropeço. No mesmo lugar. Me afundo na tal lama que chegava aos meus joelhos. A terra molhada misturada a objetos irreconhecíveis acalmam a dor que não sinto, mas vejo. O couro cabeludo também sangra e percebo que meus tufos de cabelo se juntam a outro tufos mais antigos presos no teto baixo cheio de espinhos.

O nervosismo, segundo a chegar, dá lugar ao comodismo, triste e último. A cabeça não existe e o corpo se move por vontade própria obedecendo a um instinto antigo de sobrevivência. Nada mais resta, só a respiração dificultada pelos insetos insistentes e o sangue que escorre, incomodando meus olhos e fazendo-me piscar.

Acordo. Parece que desmaiei. Tenho três ratos no colo que tentam alcançar uma cobra enrolada no meu pescoço. Meus olhos quase não se abrem e ainda assim, sei que são ratos e sei que é uma cobra. Meu rosto está devastado, minha língua imobilizada. Fecho os olhos e tento ver o mar, mas sinto a luz e, pela última vez, encaro minha sombra.

Na escuridão que domina a mais linda das florestas
Está a resposta
No coração que mente, rouba, mata e deseja o mal
Está a resposta

No grito que destrói o canto de todas as aves
Está a resposta
No fedor, no feio, no ultrajante vômito do mundo
Está a resposta

Porque a resposta está onde menos esperamos
A resposta nos aguarda onde nunca exploramos
Quando viramos a cara, nos escondemos das respostas
Quando corremos do medo, perdemos a aposta.

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