quarta-feira, 16 de junho de 2010

O caso das fitas (parte 1)

Tinha tudo armazenado. Pilhas de fitas de vídeos dentro do armário. Todas com etiquetas que nada mais mostravam que siglas. Algumas ostentavam mj10, md09, mn06, mmç08. Todas feitas com letras góticas e caneta tinteira. Roberto, o dono desta coleção, sempre foi considerado estranho por seus colegas, já que nunca teve amigos. Tinha modas passageiras; já colecionara pilhas, tampas de canetas, cuecas furadas. Há cinco anos, a mania era cuidar das tais fitas.

Era um ser realmente peculiar. Todos os dias, por volta das sete da noite, quando chegava do trabalho, ele, depois de beijar a mulher, se trancava no quarto por exatos cinco minutos. Sozinho, escancarava o armário, que vivia trancado com a ajuda de mais de três cadeados, e começava a admirar sua coleção de fitas. Baixinho, sem muita graça, considerado um homem feio pela maioria das mulheres, exceto sua mãe e sua avó, aquele era o único momento em que se sentia realmente feliz. Olhar aquela infinidade de fitas era um prazer imenso.

Sua mulher, Elza, companheira e dedicada, tentava entender aquela pequena loucura. Não havia onde assisti-las já que não tinham aparelho para aquele tipo de vídeo. Não entendia também de onde brotavam as fitas, nem lembrava quando começaram a encher o armário. Tinha perguntado ao marido sobre aquilo uma dezena de vezes, mas as respostas sempre foram grossas seguidas por dias de péssimo humor. No final das contas, conformou-se com a extravagância e só se lembrava daquilo quando via, pela fechadura, seu marido sentado no chão de pernas cruzadas olhando a tal coleção.

No natal seguinte ao começo daquela mania, Elza deu de presente para Roberto um aparelho especial para que pudessem, enfim, apreciar as fitas – se possível juntos. Roberto com o sorriso de dentes curtos e amarelos agradeceu e deixou o aparelho cair. Ele nunca foi um bom ator, e a mulher percebeu que ele quase jogara no chão o presente. Espatifado, não teve tempo de ser útil; nenhuma das fitas rodou. A partir daquele momento, a curiosidade tomou a cabeça de Elza que faria de tudo para descobrir o que significava aquela proteção patológica.

Num dia de janeiro, depois que Roberto saiu para trabalhar, a mulher decidiu tomar uma atitude concreta para desvendar aquele grande mistério. Quando a tarde chegou, Elza chamou um chaveiro. Era óbvio. Era a solução para o problema que não a deixava mais dormir. Enquanto esperava a campanhinha tocar, Elza começou um bolão consigo mesma: pornografia? Jogos de futebol? Horário eleitoral dos anos 80? Não demoraria para ela descobrir.

2 comentários:

Unknown disse...

Muiiiito curiosa...

Anônimo disse...

Agora fiquei curioso para saber o desfecho da história. Não tenho nem ideia do que possa conter as tão misteriosas fitas. Aguardo a parte 2 ansiosamente.